Quando criança - isso no Ceará dos anos 1960 - na hora de dormir, Eu e meus irmãos Luiz e José, gritávamos para Das Dores, babá e anjo da noite: "Das Dores, caga a luz!" E ela respondia, também aos gritos: "Já caguei!". Das Dores, então, desligava a luz do quarto e dos sonhos. Hora de dormir. Repetíamos a brincadeira toda santa noite, durante os primeiros anos da infância. Um dia ela foi embora e nunca mais voltou. Depois vieram Joana, a mulher das águas e dos banhos de bacia e por fim, Teresa, a mulher do amor. Joana tinha uma doce tara por mim. Banhava-me nas sombras da tarde, numa bacia com água morna e uma colher de açúcar. Dizia que era para eu crescer docinho e gostoso. "Menino bem feito", dizia sempre. Mamãe Nilce não tirava os olhos dela. Advertia: "Joana, não é para bolinar o menino!". Joana respondia que não e, silenciosamente, abusava de mim. Puxava as minhas orelhas, os meus dedos do pé e mordia - delicadamente - as minhas entranhas de homem. Até hoje não esqueço o seu sorriso de malícia e danação. Tereza veio depois, na adolescência, no melhor dos meus 12 anos. Foi mulher: de pé, frente e verso. Movia-se igual serpente. Tereza ensinou-me os segredos do pecado, as linhas cegas do corpo e os mistérios do cio. É assim, faça isso, aqui, calma: força e paciência! Das Dores, Joana e Tereza - cada uma no seu tempo - são parágrafos no livro: Na Linha do Cerol - Reminiscências poéticas. Um dia cresci e fui embora de vez. Anjos do Cerol, de uma vida inteira.
João Scortecci