A revolução de costumes provocada pela internet - que transformou a indústria fonográfica - está chegando ao mercado editorial e invertendo a relação de poder entre editoras e escritores. Nos Estados Unidos, enquanto o bilionário mercado de livros está estagnado, o segmento chamado de "autopublicação" ou "impressão sob demanda", visto com um certo desdém pelas editoras tradicionais, não para de crescer. Atualmente, 78% dos títulos novos são de editoras que trabalham com autopublicação, segundo a Publishers Marketing Association.
Confirmando a teoria da "cauda longa", de Chris Anderson, essas editoras lucram com a venda de tiragens menores de um número maior de autores. Nesse modelo, praticamente não existe rejeição. São as editoras que buscam seus autores, colocando na internet anúncios de "publique seu livro".
Se no passado o autor que bancava sua publicação encontrava dificuldades para distribuir seus livros, com a internet esse problema desaparece. A maior parte dessas editoras tem parcerias com grandes livrarias virtuais, como a Livraria Cultura, no Brasil.
Enquanto no Brasil esse mercado é nascente, ainda com poucas editoras, nos Estados Unidos já há dezenas. Algumas dedicam-se a publicar livros de maiores pretensões literárias, com serviços de edição e revisão. Mas o grosso desse mercado é a a publicação de livros cujo alcance não vai muito além do próprio autor e seus familiares - segmento que nos EUA é chamado de "Vanity Press", ou "editora de vaidades".
O mais popular dos sites de autopublicação é o Lulu.com, que permite materializar qualquer tipo de livro - romances, catálogos, livro de receitas, álbuns de foto -, além de CDs e DVDs. O usuário faz tudo pela internet, escolhe entre alguns modelos padrões de diagramação e de capa e, em poucos dias, recebe o produto em casa, na quantidade que desejar. O site possui ainda uma loja virtual onde a criação de todos os seus clientes pode ser adquirida, dentro do sistema de impressão sob demanda.
O modelo de autopublicação tem sido muito procurado por autores que não têm acesso a grandes editoras e também por mestres e doutores interessados em publicar suas teses. Outro grande filão é o de livros técnicos e científicos escritos por professores, médicos, advogados, engenheiros, que costumam dar aulas ou palestras. "Esses profissionais, que vendem os próprios livros em palestras, estão vendo que ganham muito mais na autopublicação do que em uma edição tradicional", explica João Scortecci, escritor e empresário que está nesse mercado de autopublicação há quase 30 anos. Com serviços de edição, gráfica e comercialização, o grupo Scortecci fatura R$ 3 milhões.
Ele diz que esse mercado mudou radicalmente nos últimos cinco anos. "Havia muito preconceito, mas hoje os autores estão vendo que eles têm muito a ganhar." Na opinião dele, além da evolução tecnológica das impressoras, esse mercado vem sendo impulsionado por uma mudança de comportamento. "Com essa onda de blogs, tem muita gente exercitando a escrita e querendo transformar seus diários, suas experiências, em livros."
Scortecci reconhece que o preconceito contra a autopublicação ainda não acabou, mas rebate exibindo alguns prêmios literários importantes: melhor livro de poesia da Academia Brasileira de Letras em 2008, com "Discurso Urbano", de Izacyl Guimarães Ferreira, e melhor romance da Fundação Biblioteca Nacional, em 2007, com "O Tempo Físico", de Idalina Azevedo da Silva.
Estadão
Mariana Barbosa
15.03.2009