“Ditoso” significa aquele que tem boa dita, venturoso, feliz, afortunado! Não
li o livro “A Casa dos Budas Ditosos”, do escritor baiano João Ubaldo (João
Ubaldo Osório Pimentel Ribeiro, 1941 - 2014). A obra foi lançada pela Objetiva,
em 1999, e — é o que dizem — tem o pecado da luxúria como tema central. Em
forma de monólogo, uma mulher de 68 anos de idade, nascida na Bahia, narra sua
vida e como jamais se furtou a viver — sem respingos de culpa — as infinitas
possibilidades do sexo. “Buda”, que significa “desperto”, é um título atribuído
na filosofia budista àqueles que despertaram para a verdadeira natureza dos
fenômenos — impermanentes, insatisfatórios e impessoais — e se puseram a
divulgar tal descoberta aos demais seres. Título é título, e nós, escritores,
sofremos com isso. Alguns títulos nascem prontos e, em alguns casos, até antes
da obra concluída. Outros, não! Escolhê-los, para muitos, é uma tortura. Eu —
quando o danado tenta complicar a minha vida — recorro a subtítulos, partindo,
sempre, de um título curto. Funciona. “A Casa dos Budas Ditosos” — reafirmo,
não li — parece-me um desses títulos que guardam em si seus próprios segredos e
mistérios. Na dúvida: devo informar-me, procurar saber, até lê-lo e não pecar
pela luxúria do “não li e não gostei”, máxima atribuída ao poeta modernista
Oswald de Andrade, quando perguntado sobre um livro do romancista José Lins do
Rego (1901-1957). Do escritor João Ubaldo, li os romances “Sargento Getúlio” e
“O Sorriso do Lagarto”. Nunca nos falamos e, quando estivemos próximos, na
cerimônia de entrega do Prêmio Jabuti de 1984, a ele outorgado naquele ano,
pela obra “Viva o Povo Brasileiro”, a sorte passou batida. Lendo sua biografia
literária, vi que “Sargento Getúlio” — obra regionalista, que tem como tema o
banditismo no sertão nordestino e usa linguagem coloquial e repleta de
regionalismos — recebeu o Prêmio Jabuti de 1972, de “Autor Revelação”,
categoria que a CBL - Câmara Brasileira do Livro, responsável pela premiação,
abandonou de vez. Uma pena! Vez por outra, reclamo e nunca sou atendido. A
justificativa é simples: não acho justo um autor novo ou estreante em
determinada categoria concorrer — nas mesmas condições — com um escritor maduro
e conhecido. É frustrante. Para o Prêmio Jabuti de 2021, a Scortecci Editora
inscreveu 45 títulos e em 2022, 37 títulos, todos de autores novos ou
estreantes em várias categorias. Não pescamos nada. Temos — com orgulho e
luxúria — um Jabuti, em 1986 e, por mais sete vezes, estivemos na seleção dos
10 finalistas, nas categorias poesia, conto, reportagem e literatura infantil.
Voltando ao João Ubaldo, se vivo fosse, hoje, dia 23 de janeiro, estaria
completando 82 anos de idade. Ainda “não há prova científica de que existem
lagartos que sorriem.” Mas assim são os fenômenos ditosos da vida:
impermanentes, insatisfatórios e impessoais.
João Scortecci
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