Eu tinha pouco mais de sete meses de idade quando aconteceu a tragédia do desabamento do teto da igreja do Sagrado Coração de Jesus. Foi uma sexta-feira, dia 15 de março de 1957, por volta das 13h15, na cidade de Fortaleza/CE. Morávamos a três quarteirões da igreja, no centro, na Avenida D. Manoel, quase esquina com a Av. Duque de Caxias. Minha irmã, Ana Cândida - a caçula - ainda não havia nascido, e estávamos de malas prontas - de mudança - para a Fazenda Nilcevia, na cidade de Dois Córregos, interior de São Paulo. Meus avós maternos haviam sofrido um grave acidente de carro, e minha avó, Maria Aparecida, precisava de cuidados especiais, tempo que durou três anos. Meus irmãos, Luiz Gonzaga e José Henrique, com 6 e 7 anos de idade, respectivamente, na hora do desabamento da igreja estavam no grupo escolar, do outro lado da praça, a não mais que 15 metros de distância da igreja. O estrondo foi de tremer o chão. Minutos depois, o telefone tocou - era do grupo escolar - e papai foi buscá-los de jipe. A exemplo de Roma, Fortaleza é uma cidade construída sobre seis colinas, assentada numa planície que varia de 15 a 20 metros acima do nível do mar. A igreja se localizava na colina “Alto da Pimenta” - conhecida, popularmente, como “Morro do Pecado” -, onde antes existira uma capela construída pelo “Boticário Ferreira” dedicada a Nossa Senhora das Dores. A igreja foi construída por José Francisco da Silva Albano, Barão de Aratanha, a pedido da baronesa, Liberalina Angélica da Silva Albano, para seu filho Frei Xisto Albano, um frade da ordem dos capuchinhos, que, mais tarde, tornou-se bispo. Nos anos 1950, para abrigar um conjunto de sinos, a torre-agulha da igreja foi demolida, e, no seu lugar, foi construída outra torre, dessa vez, quadrada. As bases da torre original não resistiram, e tudo veio abaixo. A notícia do desabamento se espalhou, e logo uma grande multidão ocupou a praça. Até o Governador Paulo Sarasate e a primeira-dama, Albanisa Rocha Sarasate, compareceram à Praça do Sagrado Coração de Jesus, solidarizando-se com o povo de Fortaleza. Meus irmãos, Luiz Gonzaga e José Henrique, até hoje contam sobre a tragédia, o estrondo e a poeira que cobriu tudo. Ninguém, por sorte, ficou ferido. A igreja foi reconstruída e, coincidência ou não, oficialmente reinaugurada em 26 de novembro de 1961, na semana em que havíamos “reocupado” a casa da Av. D. Manoel, reformada, depois de quase três anos morando em Dois Córregos. Muito se fala sobre o “Morro do Pecado” e de o lugar ser “assombrado”. Já escutei de tudo: morte de padres, acidentes de carro, santas desaparecidas... Pesquisando, não encontrei nada de concreto. Dizem - verdade ou mentira - que o espírito do “Boticário Ferreira” (Antônio Rodrigues Ferreira de Macedo, 1800-1859) ainda peca por lá e não abre mão dos prazeres do “Morro do Pecado”. Ferreira foi político, farmacêutico e militar. Foi prefeito de Fortaleza por dois mandatos. Em sua homenagem foi renomeada a “Praça Municipal” - no centro e principal praça da cidade - para “Praça do Ferreira”.
01.01.2022
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