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MELLO MOURÃO: “OU DANTE OU NADA!”

O poeta, ficcionista, político, tradutor, ensaísta e biógrafo Gerardo Mello Mourão (Gerardo Majella Mello Mourão, 1917 – 2007), nasceu em Ipueiras (Microrregião de Ipu), no estado do Ceará. O topônimo “Ipueiras”, de origem tupi-guarani, é formado por “y”(“água”), “puera” (“que já foi e não é mais”) e significa “lugar raso onde se acumula água”, “rio que corria e já não corre”. Foi criado em Crateús, às margens do Rio Poti, onde assistiu à passagem da Coluna Prestes, movimento político-militar brasileiro (1924 – 1927), motivado pela insatisfação com o governo do presidente mineiro Artur Bernardes (1875 – 1955) e o regime oligárquico conhecido como “café com leite”, com a predominância do poder nacional de São Paulo e Minas Gerais. Aos 11 anos de idade, ingressou no Seminário dos Redentoristas holandeses, em Congonhas do Campo – MG, e, aos 17 anos, tomou o hábito de Santo Afonso de Ligório, no Convento da Glória, em Juiz de Fora. Poliglota, aprendeu línguas vivas e deu vida a línguas mortas, além do Latim e do Grego, o Holandês, o Alemão, o Francês, o Italiano, o Inglês e o Espanhol. Deixou o convento e ingressou em curso de Direito, que abandonou antes de concluir. Gerardo Mello Mourão é considerado figura-chave da literatura nacional e também da lusófona. Suas obras mais famosas são “Invenção do mar” (Record, 1998), com a qual recebeu o Prêmio Jabuti, e a trilogia “Os Peãs” (Record), formada pelos livros “O país dos Mourões” (1963), “Peripécias de Gerardo” (1972) e “Rastro de Apolo” (1977). Durante sua juventude, aderiu ao integralismo e, mais tarde, foi acusado de colaborar com o comunismo. Durante a ditadura de Getúlio Vargas (1938 – 1945), foi preso 18 vezes. Em 1942, acusado de colaborar com nazistas, foi condenado à morte, depois à prisão perpétua, pena reduzida a 30 anos de prisão, dos quais cumpriu cinco anos e 10 meses. Durante o período da ditadura militar brasileira (1964 – 1985), foi eleito duas vezes deputado federal pelo estado de Alagoas, depois cassado e torturado. Dividiu cela com nomes como Zuenir Ventura, Ziraldo, Hélio Pellegrino e Osvaldo Peralva. Um inquieto! Com Abdias do Nascimento, Godofredo Iommi, Efrain Bo, Raul Young e Napoleón López, formou uma aliança poética chamada “La Santa Hermandad de la Orquídea”. Tinham como maior inspiração o escritor italiano Dante e, por isso, adotaram o lema: “Ou Dante ou nada”. Eis um trecho do discurso de Gerardo Mello Mourão ao receber o título de “Doutor Honoris Causa” pela Universidade Federal do Ceará, em 1993: “Pois, éramos seis. Fomos armados cavaleiros quando aquele grupo de adolescentes, numa praça de Buenos Aires, resolveu queimar em praça pública tudo quanto até então escrevera, num pacto que se chamou ‘Pacto del Victoria’, do nome do local em que nascera. Todo o compromisso do pacto foi escrito numa única linha: – ‘Ou Dante ou nada’. Por isso, queimaram-se todos os versos da ‘juvenília’. Não teríamos o direito de escrever o já escrito, de dizer o já dito. A rompante legenda adolescente nos sagrou cavaleiros da Senhora Poesia, da Senhora Musa. Passamos a chamar-nos por um nome secreto. Éramos a ‘Santa Hermandad de la Orquídea’. A guilda órfica navegou todos os continentes e tentou lavrar todas as glebas do saber e do fazer poético (...). Aqui estou também eu: ‘ego poeta’. Pois, ‘poeta sum’."

João Scortecci