O lugar existe. Papel de seda, linha 24, palitos de palha de coqueiro e cerol. E goma, claro. Uma tigela cheia. “Filho, não é muito grude?” Talvez. É que o Chico vai ajudar na feitura do quadrado da arraia e ele come grude mais do que trabalha! “Grude?” Sim. Na casa dele não tem comida. Acabou tudo. Estão passando fome. “Quem disse isso?”. Era mamãe Nilce querendo saber. Foi a Margarida. “Aquela carioca avançadinha que mora na vila?” Sim. Ela mesma. “Menina - danada - filha do capeta, que não pode ver um homem!”. “Dizem que ela mastiga carambola com a perereca e depois obriga os meninos da rua a comerem o bagaço”. “É verdade?” Não sei de nada. “João: você gosta do bagaço da carambola?” Mamãe Nilce quis saber. Mãe, eu só como carambola do pé. Juro. “Olha lá!”. “E esses dedos cruzados no bolso?” Mania. “Quer levar um pão com ovo para o Chico?” Não precisa. Obrigado. O negócio dele é mesmo comer grude. Mãe, eu preciso de uma meia de mulher e um trapo de pano velho. “Posso saber para quê?” Para peneirar o cerol - não pode ter furo. “E o pano?”. Para fazer um rabo de escama para a arraia. ”Vê se não chega tarde!”. “E na volta toma banho descente!”. De novo? Já tomei ontem. “Lavou as orelhas?” Lavei. “E os pés?” Também. A “danada” da Margarida não olha suas orelhas? Não. Já disse: carambola só do pé. E o Chico? Ele come apenas o grude. Gosto é gosto.
João Scortecci
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