Nos dois últimos editoriais para a Revista Abigraf, escrevi sobre democracia e política industrial. Encerro o assunto, no editorial de hoje, tratando especificamente da escassez de mão de obra qualificada para a indústria gráfica brasileira e mundial e também da carência de mão de obra indireta, de apoio à produção, como a manutenção de máquinas e equipamentos.
Segundo pesquisas e depoimentos de empresários gráficos, o problema é gravíssimo, capaz até de frear o crescimento da “nova” industrialização, levando ao atraso, à estagnação tecnológica e à ineficiência dos processos de produção. O problema atinge não só as grandes gráficas, mas também as médias e pequenas empresas da arte de imprimir.
Depois dos anos 1970, o País passou por um processo de desindustrialização feroz e criminoso. Esqueceram que ela, a indústria, representa o processo dinâmico e virtuoso de uma economia próspera, aquela que agrega valores ao produto – e a toda a cadeia produtiva – , criando, com responsabilidade, o maior número de empregos qualificados. A diminuição do peso da indústria de transformação no PIB – como vem ocorrendo no Brasil e em outros países emergentes – criou um tipo perigoso de dependência, uma vez que todos, ricos e pobres, consomem produtos industriais com mais qualidade e em quantidades cada vez maiores.
Com a pandemia da Covid-19 e suas trágicas consequências sociais e econômicas, os países industrializados perceberam o erro que haviam cometido e iniciaram, prioritariamente, políticas governamentais de apoio e investimentos para uma “nova” industrialização, edificada nos pilares da tecnologia, da qualidade e da sustentabilidade. A forte retomada industrial após a pandemia expôs o elo fraco da cadeia produtiva: a escassez de mão de obra qualificada para trabalhar nesse novo contexto.
O termo “mão de obra”, como se sabe, designa o emprego manual direto na produção industrial. As empresas, a cada ano, têm mais dificuldades para preencher vagas desse tipo. Estima-se que, até 2030, a escassez atingirá 85 milhões de vagas em aberto, em todo o mundo. Mesmo que a robotização ocupe esse vácuo industrial – isso acontecerá, não há dúvidas – ficará faltando, no todo, no diferencial, o elo da criação e da arte de imprimir, o magma do espírito humano e sua singular natureza.
Somente o ser humano poderá continuar escrevendo e imprimindo no tempo suas ideias e valores, sua própria história. O desafio é, portanto, continuarmos ocupando, com a inteligência, o trabalho e a sabedoria do espírito de Gutenberg, os espaços do passado, do presente e do futuro.
João Scortecci