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CATECISMOS DE ZÉFIRO: O DEUS DA SACANAGEM

Eu menino de tudo na Fortaleza dos anos 1964, talvez 1965. Fui pela Pero Coelho na direção da Pedro I, até a Cidade da Criança, hoje Parque da Liberdade. A banca que vendia “catecismo” ficava na esquina com a Solon Pinheiro. Pedi: “Moço quero comprar um catecismo!”. O jornaleiro me olhou, fez que não escutou, deu volta completa na banca e, do nada, apareceu com um pacote embrulhado em papel de pão, amarrado com barbante grosso. “Qual número?” Perguntou. “O último!” Respondi. Guardei a revistinha na pasta do colégio e fui embora, veloz. Cortei caminho pela praça da Igreja Coração de Jesus e entrei no Colégio Cearense. Fui até o banheiro e lá, abri o exemplar do catecismo - princípios, dogmas e preceitos da doutrina pornô-erótica -  do Carlos Zéfiro, conhecido, também, como o “Deus da Sacanagem” (livro do jornalista Gonçalo Junior, A vida e o tempo de Carlos Zéfiro, Editora Noir). Carlos Zéfiro é o pseudônimo do funcionário público carioca Alcides Aguiar Caminha (1921 - 1992) com o qual ilustrou e vendeu, durante as décadas de 1950 a 1970, histórias em quadrinhos pornô-erótico, no formato 14 x 21 cm, com 24 a 32 páginas, que ficaram conhecidas por "catecismos".  A revista Status chegou em 1974 (Editora Três) e a Playboy (Editora Abril) no ano seguinte, em 1975. Até 1970 quem alimentava o sonho pornô-erótico da garotada (e de muitos adultos, também) era o Mestre Zéfiro, que permaneceu no anonimato até 1991, até a reportagem do jornalista Juca Kfouri para a Revista Playboy. Zéfiro manteve o anonimato sobre sua verdadeira identidade por temer ter seu nome envolvido em escândalo o que lhe traria problemas por se tratar de funcionário público. Foi também compositor, inscrito na Ordem dos Músicos do Brasil e parceiro de Guilherme de Brito e Nelson Cavaquinho, com quem compôs quatro sambas para a escola de Samba da Mangueira, entre eles: Notícia, A Flor e o Espinho. Zéfiro faleceu na cidade do Rio de Janeiro, em 5 de julho de 1992, aos 70 anos de idade. Hoje recebi pelo WhatsApp um vídeo com uma história do Zéfiro. Fiquei arrepiado: talvez, ainda - reflexo corporal do primeiro arrepio, aquele, dos anos 1960, no banheiro do Colégio Cearense. Zéfiro era mesmo um "Deus da Sacanagem", Mestre do pornô-erótico em quadrinhos, professor de catecismo, de toda uma infância.


João Scortecci