O poeta e dramaturgo alemão Bertolt Brecht (Eugen Bertholt Friedrich Brecht, 1898 - 1956), morreu alguns dias depois do meu nascimento. Eu no Ceará e ele em Berlim. Fim das coincidências. Brecht poeta tem lá os seus encantos literários. Merece ser lido. Em mãos o livro “Bertolt Brecht: Poesia: 60” (edição bilíngue, ano 2019, editora Perspectiva, 584 páginas). Para Brecht a poesia expressa tudo que está vivo, limpo ou sujo. Interessante. Ele canta até a latrina, para ele um lugar plácido em que a gente se recosta tendo em cima estrelas e debaixo merda. Muita merda! O poeta não admite meio termo: o sujeito deve ser frio ou quente: morno nem a pau! Branco ou preto. “Cinza me faz mal.” Isso fez lembrar-me de duas expressões muito usadas no meio literário: “Não li e não gostei” e “leia a obra e esqueça a pessoa do autor” coisas assim. Conheço editores - alguns até amigos - que recusaram obras incríveis por causa de antipáticos e estúpidos autores. Acontece. O inverso – também – é verdadeiro. Editores chatos! Chato - já dizia Guilherme Figueiredo – é um tratado geral de oportunidades. Tudo coisas da hora. Dizem – não sei se é verdade – que a expressão “não li e não gostei” foi pronunciada pela primeira vez por Oswald de Andrade (1890 – 1954), quando, então, perguntado sobre o livro “Riacho doce” (1939) do romancista e jornalista paraibano José Lins do Rego (1901 – 1957). Outro dia um autor “antipático” e “chato” publicou numa antologia da Scortecci uma poesia em homenagem as latrinas e as merdas do mundo. Texto ruim. Fedorento. Alguém do editorial alertou-me: “Scortecci, olha isso! Vamos publicar?”. Respondi: “Sim”. Na verdade – em 43 anos de livros, mais de 11 mil títulos - nunca recusei um texto, um livro ou um autor. Sou ferramenta! Digo sempre: Tudo coisas da hora! Oportunidades, talvez. Aqui pergunto: Onde fica mesmo o tal lugar plácido em que a gente se recosta tendo em cima estrelas e debaixo merda?”. O cinza me faz mal.
João Scortecci