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A JIBOIA DO AMOR DA CIDADE DE MACAPÁ / JOÃO SCORTECCI

Gael, amigo de Macapá, já falecido, trouxe de lá, isso no final dos 1980, uma jiboia de quase 2 metros de comprimento. Venenosa? Não. Quando está de barriga cheia é um anjo: doce e carinhosa! Dorme na minha cama. Explicou. E o que ela come? Perguntei, desconfiado. Aqui em casa, por enquanto, apenas ovos de galinha feliz. A jiboia tem nome? Tem. Chama-se Ana Coriolis. É uma fêmea. Coriolis? Isso mesmo. Nome estranho para uma jiboia. Por quê? Quis saber. A moça tem olhar cariólico, sobrenatural, enigmático, penetrante, magnético e sensual. Olha e vê. Encarei, então, a cobra. Ela docemente mostrou-me a língua. E o prenome Ana? Insisti. Uma homenagem a uma amiga de Macapá que no ato do amor fazia com o corpo todas as rotações da Terra. Uma cobra! Entendi. Foi quando, curioso que sou, lembrei-me da história do ovo de galinha que fica em pé quando colocado na linha imaginária do Equador, na linha que divide os Hemisférios Norte e Sul. É verdade? Ele riu. Dizem que é por causa da Força Coriolis, algo assim. Uma brincadeira. O mistério atrai turistas de tudo que é lugar, que querem testar se o ovo fica mesmo de pé ou não. No monumento do Marco Zero do Equador tem um “relógio de Sol”, com 30 metros de altura que marca o local por onde passa a linha imaginária do Equador, que divide Macapá em hemisfério norte e sul. Explicou. Foi quando Ana Coriolis, a jiboia do amor, deu um nó nas minhas pernas e começou a apertá-las, com magnetismo sensual e olhar sobrenatural. E agora? O que faço? Protestei. Gael, então, pacientemente, trouxe dois ovos de galinha feliz e os colocou perto da boca de Aninha. Ela cheirou os ovos, passou a língua e me soltou. Hoje, no café da manhã, comi pão de milho com ovos de galinha feliz. Lembrei-me, então, do amigo e da jiboia Ana Coriolis. Gael faleceu na virada do século. Dizem – não sei se é verdade – que morreu de amor, enroscado nos braços de uma jiboia e lá ficou, com o coração vendido de paixão, perdido na linha imaginária do Equador.    

João Scortecci