Conhecer o escritor, professor, pesquisador, economista e consultor da Fundação Dom Cabral, José Paschoal Rossetti (1941- ), foi uma das coisas mais importante da minha vida pessoal e profissional. Tive oportunidade de lhe dizer isso, um ano antes da pandemia, numa ligação telefônica. Contei-lhe a minha história de poeta, editor e gráfico e ele, educadamente, disse-me: “Lembro de você!’. Foi Rossetti quem me mostrou a singularidade da poesia, sugeriu que mudasse de curso na universidade e me ensinou, mais do que tudo, segredos sobre a arte de publicar livros. Conhecemo-nos na Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie, onde Rossetti era professor da cadeira de Introdução à Economia I. No início das aulas, sempre conversávamos sobre livros, futebol – eu torcedor do Palmeiras e ele, do Bugre, o Guarani de Campinas – e muito sobre poesia. Penso ter escutado que era poeta concretista, amigo dos irmãos Haroldo e Augusto de Campos, de Décio Pignatari e outros. Em 1978 eu já trabalhava com livros, pelo Poeco – grupo literário que nasceu na universidade –, escrevia para jornais universitários e tinha amigos na Atlas, casa editorial que publicava seus livros. Lendo sua entrevista para o Museu da Pessoa, soube que, na adolescência, Rossetti também foi aluno em colégio Marista: ele, em Poços de Caldas/MG, eu, em Fortaleza/CE, e, por obra do destino, para cuidar da vida, ele teve que mudar do curso de Direito para o de Economia. Escreveu: “Para fazer Faculdade de Direito, que eu era uma pessoa que tinha facilidade de expressão, tinha uma redação bastante razoável, gostava de artes, de letras, de escrever e Direito seria um caminho natural pra pessoas que tinham esse tipo de talento, de capacitação. As profissões eram o Direito, a Medicina e a Engenharia. E era isso.” Naquele incrível ano de 1978, o Palmeiras perdeu o título nacional para o time do Guarani, que tinha Capitão, Renato, Careca e Zenon. Muita gozação! Rossetti, então, certo dia, olhou-me e disse: “Traga cinco poesias, suas preferidas”. Foi o que fiz. Hoje, quando um poeta novo me pede opinião sobre o seu trabalho, peço-lhe, sempre, também, cinco poesias e nada mais. Rossetti, sempre apressado, guardou-as na sua pasta de couro e foi embora, em silêncio. Ficou com elas por quase um mês. Quando as devolveu, três delas estavam riscadas com um “x” e no cabeçalho da folha escrito: “Lixo!” Nas duas outras poesias, círculos em alguns versos e escrito na diagonal: “Isso é bom!” Fui um dos poucos alunos a tirar nota máxima numa de suas provas de Introdução à Economia I. Ele, então, me chamou no canto da sala e disse: “Você vai ser um péssimo advogado. Não leva jeito. Você deveria mudar de curso. Fazer Administração ou mesmo Economia”. Fiquei surpreso, confesso. Disse-lhe: “Não posso perder dois anos de faculdade, atrapalharia o meu projeto de vida”. Rossetti, então, olhou-me nos olhos e perguntou: “Quer mudar?”. Respondi: “Quero!”. Sorriu e foi embora, em silêncio. Dias depois mudei de curso, assim, do nada, num passe do destino. Advogado? Jamais. Dói pensar na desgraça que seria. Tive sorte! Rossetti é autor de 15 livros, entre eles o best seller “Introdução à Economia”, de 994 páginas, com mais de 1 milhão de exemplares vendidos. Numa entrevista para o Museu da Pessoa, declarou: "Eu achei que não vale a pena um depoimento meu, não tem a menor significação, eu não sou nenhuma personalidade importante coisa alguma, apesar de ter aí os meus livros e ser lembrado, em todos os lugares por onde eu passei, eu sempre sou lembrado (...)". E mais: foi Rossetti, humilde, querido por todos e inesquecível, quem me ensinou os caminhos da poesia e os versos do poema sem-fim.
João Scortecci
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