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NENÊ ROMANO: A CORTESÃ FLOR DE RUA E LAMA / JOÃO SCORTECCI

O Combate foi um jornal anarquista - ideologia política que se opõe a todo tipo de hierarquia e dominação - e operário, da cidade de São Paulo, de propriedade do jornalista Nereu Rangel Pestana, que circulou de 1914 até meados de 1929. Lendo matéria a "Paixão Fatal. O Dr. Moacyr Piza”, de 26 de outubro de 1923, sobre o assassinato da cortesã Nenê Romano (Romilda Macchiaverni, 1898 - 1923) e o suicídio do escritor e advogado de família ilustre paulistana Moacyr Piza (Moacyr de Toledo Piza, 1891 – 1923), uma palavra chamou-me atenção, além da tragédia: mulíebre. Não conhecia. Mulíebre significa relativo a mulher ou próprio de mulher. Segue texto: “Dr. Piza, num momento irrefletido, assassina a tiros de revólver - três tiros, nas proximidades da Rua Sergipe com a Praça Buenos Aires, em Higienópolis - a conhecida mundana Nenê Romano e suicida-se em seguida. Matou-se Moacyr Piza, o brilhante, o audaz, o valoroso escritor que todo São Paulo admirava. Matou-se depois de ter matado Nenê Romano, a mulher fatal, que tinha um rosto de anjo e uma alma perversa. Nenê Romano, flor de rua e da lama, mulher do povo e contra o povo, que possuía o sorriso que acendia os mais perigosos fogos da paixão torturante e louca; o mais completo símbolo da leviandade e da perversidade mulíebre conseguiu, com a sugestão da mulher que faz sofrer e ri, armar o braço de Moacyr Piza e desafiar a morte." Que doideira! Depois li na Revista Piauí, de julho de 2012, o brilhante texto contando a história de Nenê Romano, Moacyr Piza, Iria Junqueira (a maior exportadora de café do Brasil e quiçá do mundo) e outros, pelo saudoso historiador Boris Fausto (1930 – 2023). Sobre o texto do Jornal O Combate, que se opõe a todo tipo de hierarquia e dominação, uma observação que jamais vou esquecer a cena: “com a sugestão da mulher que faz sofrer e ri, armar o braço de Moacyr Piza e desafiar a morte." Desconfio, sempre. 

João Scortecci